Uma das prioridades do centrão é um projeto que diminui o alcance da lei de improbidade administrativa e elimina a forma “culposa”. Foto: Dida Sampaio/Estadão Fora da lista de projetos citados como prioritários pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em um documento direcionado a deputados e senadores, uma pauta “oculta” deverá ganhar corpo no Congresso, impulsionada pela ascensão do centrão. Aliados do presidente da Câmara, Arhur Lira (PP-AL), e até integrantes da oposição enxergam o novo momento como propício para o avanço de propostas que afrouxam a punição para crimes associados ao mau uso de dinheiro público e à corrupção. Fazem parte dessa agenda não propagandeada a limitação da punição em casos de improbidade administrativa e lavagem de dinheiro, além da proibição de buscas em escritórios de advocacia. Na outra ponta, duas Propostas de Emenda à Constituição — a da prisão após a condenação em segunda instância e a que extingue o foro privilegiado — seguirão a passos lentos, na mesma toada da gestão do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ). Uma das prioridades do centrão é um projeto que diminui o alcance da lei de improbidade administrativa e elimina a forma “culposa” — sem intenção do ato. De acordo com o relatório do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), já entregue, as violações que não gerassem prejuízos ao Erário ou enriquecimento ilícito deixariam de ser enquadradas como improbidade. “Essas matérias não estão na lista de prioridades do governo, então podem entrar na pauta caso os líderes (partidários) queiram. Pessoalmente, sou a favor de mudar a lei de improbidade, para incluir só o que causa prejuízo ao Erário. Hoje, qualquer coisa é improbidade, e as penas são muito altas”, diz o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Zarattini frisa que, com as mudanças, a lei vai continuar a permitir o bloqueio de bens e suspensão de direitos políticos daqueles que cometem improbidade. “A lei não pode ser tão ampla. Há casos em que há condenações mesmo sem ter havido irregularidades”. No ano passado, a Câmara de Combate à Corrupção do Ministério Público Federal classificou as alterações pretendidas como “um dos maiores retrocessos no combate à corrupção e na defesa da moralidade administrativa”. Em 2020, a Câmara criou ainda uma comissão de juristas para discutir a tipificação da lavagem de dinheiro. Nos primeiros debates, advogados fizeram sugestões para amenizar as punições previstas na lei e tornar mais difícil a condenação por lavagem, que passaria a exigir um crime antecedente. Aliados de Lira ouvidos pelo GLOBO avaliam que esse tema deve caminhar mais lentamente — ainda não há previsão de quando o colegiado vai voltar a se reunir —, mas que há boas chances de avanço. Quando os encontros forem retomados, é provável que o número de pessoas envolvidas no debate seja reduzido, o que facilitaria o andamento. Também no fim do ano passado, a Câmara aprovou a urgência da proposta que impõe obstáculos a mandados de busca e apreensão em escritórios de advocacia. O projeto, portanto, pode ir a plenário a qualquer momento. O texto torna praticamente inviolável o escritório ou local de trabalho do advogado. Não poderão ser expedidas buscas com fundamento em indício, depoimento ou colaboração premiada, sem a presença de provas periciadas e validadas. “Não agrada 100% a todos, mas tem espaço para consenso e votação. É preciso buscar o que a Constituição já estabelece para proteger o exercício da advocacia, mas não é respeitado”, diz o deputado Paulo Abi Ackel (PSDB-MG). Atuação anti-moro Crítico da Lava-Jato e réu em duas ações penais no Supremo Tribunal Federal (STF) — ele nega os crimes —, Lira sempre foi um dos parlamentares mais empenhados no Congresso a impor obstáculos à pauta do ex-ministro Sergio Moro. Em 2019, atuou para aprovar a Lei do Abuso de Autoridade e para modificar pontos do pacote anticrime, proposto por Moro. Agora, a avaliação no Congresso é que há consenso para a aprovação de uma quarentena eleitoral para juízes, integrantes do Ministério Público e policiais. Para o cientista político Carlos Pereira, professor da FGV, o pacote de intenções do centrão não necessariamente encontrará apoio majoritário entre os parlamentares. “É fundamental lembrar que a situação do governo com o centrão não é majoritária, nada garante que a última vitória será reproduzida e convertida em políticas concretas no Parlamento. Acredito ser muito mais fácil a progressão de pautas econômicas, alinhadas à centro-direita, do que temas sobre costumes ou mesmo conectados com a Lava-Jato”.
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