Num instante em que o PSDB tenta calibrar suas divergências em relação a Dilma Rousseff, FHC defende em artigo a busca de “convergências em favor da decência.” Dilma já escondeu a vassoura atrás da porta. Mas Fernando Henrique Cardoso não desistiu de apoiá-la na “faxina”.
“O país cansou da roubalheira”, anota o presidente de honra do tucanato em texto pendurado no blog que mantém no recém-lançado site ‘Observador Político’. Para FHC, já “não basta denunciar, demitir, prender” os malfeitores. Achegando-se um pouco mais a Dilma, ele defende:
“É preciso buscar convergências em favor da decência nas coisas públicas. Deve-se ir fechando os canais que facilitam a corrupção.” Sugere: “reduzir drasticamente o número de pessoas nomeadas para o exercício de funções públicas sem pertencer ao quadro de funcionários da União.”
Há na máquina federal algo como 22 mil cadeiras cuja ocupação depende mais do padrinho político do que das credenciais do nomeado. Já era assim quando FHC ocupou a Presidência da República. Em oito anos de reinado tucano, nada se fez. Dilma parece ter reanimado o ex-rival:
“Por que não propor no Congresso algo nesta direção?”, FHC se pergunta. “Não acabaria a corrupção”, ele reconhece. Mas “resguardaria os partidos e o Congresso do cheiro de podridão que a sociedade não aguenta mais e atribui só a eles e seus apadrinhados os malefícios do Executivo.”
O novo tom de FHC deixa os tucanos de plumas eriçadas. Enquanto o PSDB recolhe assinaturas para abrir uma CPI da corrupção, seu líder máximo leva o pé atrás. CPI? Sim, claro, escreve FHC. Desde que não venha com a certidão de nascimento “carimbada de anti-governo.” Tem de ser uma CPI “pró-Brasil”.
Na opinião de FHC, Dilma “reagiu” contra alguns dos “desmandos” que herdou. “Importa pouco insistir em que a reação veio tarde, pois antes tarde do que nunca.” Ele recorda em seu texto que “as pessoas sérias, inclusive no Parlamento, procuram dissociar-se das teias de corrupção.”
Decerto refere-se ao “grupo ético” do Senado, liderado por Pedro Simon (PMDB-RS) –apoiadores que Dilma deixou pendurados na vassoura, falando sozinhos. Para não dizerem que perdeu o cacoete de oposicionista, FHC bateu em Lula:
“Desde o ‘mensalão’, com a permissividade do próprio presidente da época, a onda de desmandos e as teias de cumplicidade se avolumaram”, anota. Evoca comentários atribuídos a Lula quando confrontado com casos de corrupção: “’Não é tão grave assim’ ou então, ‘foi coisa de aloprados’ ou ainda de que se trataria ‘apenas’ de dinheiro para pagar contas de campanha eleitoral.” Acrescenta: “Com esta leniência compreende-se que pessoas ou setores dos partidos que apóiam o governo se sintam mais à vontade para entoar o cântico do dá-cá-toma-lá.”
Nos seus dois mandatos, FHC também deu e recebeu. Mas ele se esquiva das explicações: “Menos interessa, a esta altura dos acontecimentos, saber se houve corrupção em outros governos. Malfeitorias sempre houve…”
“…A diferença é que, de uns anos para cá, ela mudou de patamar com o sinal de perdão diante de cada caso denunciado.” Importante mesmo é considerar que Dilma “reagiu” e perseguir as tais “convergências em favor da decência.”
Na campanha eleitoral, FHC alvejara Dilma com alguma virulência. Tachara-a de “boneca de ventríloquo”, insinuara que era despreparada. Amoleceu o discurso depois de receber de Dilma uma carta amistosa. A pretexto de cumprimentá-lo pelo aniversário de 80 anos, a ex-boneca afagou FHC.
Chamou-o de “acadêmico inovador”, “político habilidoso”, “o presidente que contribuiu decisivamente para a consolidação da estabilidade econômica.” O PSDB talvez devesse enviar uma carta ao seu líder. Um texto no qual pedisse perdão por ter escondido seu amor no armário por tantos pleitos e carnavais. Ou isso ou adeus!
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